Cancro do Pulmão Saber mais...
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O cancro do pulmão é um processo devido ao crescimento descontrolado de células anormais que se encontram no pulmão.
Normalmente as células crescem e dividem-se para formar novas células que vão substituir as que envelheceram e morreram. Enquanto estas novas células normais se diferenciam para ocupar um local e função para manter a vida, as células tumorais crescem e multiplicam-se de forma desordenada, dando origem a um tumor.
Os tumores malignos ou cancros caracterizam-se pela sua capacidade de invadir outras partes do corpo. No cancro do pulmão o crescimento anormal é inicialmente pulmonar, podendo invadir e danificar os órgãos e tecidos circundantes, mas depois podem invadir os vasos sanguíneos e os vasos linfáticos, permitindo que células tumorais entrem no sangue e na linfa e cheguem a outros órgãos e tecidos (gânglios linfáticos, fígado, ossos, cérebro, …) onde vão formar novos tumores (metástases).
Como todos os órgãos do nosso corpo, os pulmões são feitos de muitos tipos de células, e por isso podem existir cancros do pulmão diferentes. O cancro do pulmão compreende dois grandes tipos: carcinoma pulmonar não pequenas células com dois subtipos principais: adenocarcinoma, o mais comum (60%) e carcinoma escamoso (25-30%) e carcinoma pulmonar de pequenas células. Estes dois tipos de carcinoma do pulmão têm evolução, tratamento e prognóstico muito diversos.
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O cancro do pulmão é o cancro mais frequente no Mundo. A sua incidência aumenta a um ritmo de 0.5% por ano.
Em Portugal foram diagnosticados em 2018 (dados OMS) cerca de 5 284 novos casos de cancro do pulmão, representando a terceira neoplasia mais frequente no País.
Em Portugal é a principal causa de morte por doença oncológica, estimando-se 4 671 mortes pela doença em 2018.
A maioria dos doentes são diagnosticados em estado avançado, uma vez que o tumor pode desenvolver-se durante bastante tempo sem dar sintomas. No entanto estão a surgir novos tratamentos que podem melhorar as perspectivas destes doentes.
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O tabaco é o principal factor de risco para o cancro do pulmão. Oitenta e cinco a 90% dos novos casos são detectados em fumadores. Somente com a eliminação do tabagismo na população é que os casos de cancro do pulmão podem ser reduzidos.
Sabe-se hoje que uma das substâncias existentes no fumo do tabaco, a nicotina, pode provocar dependência, tornando difícil para o fumador parar de fumar. Há no país uma rede alargada de consultas de cessação tabágica para ajudar os fumadores a parar de fumar.
Nunca é tarde para parar, mesmo em doentes com cancro do pulmão, uma vez que esse esforço vai diminuir as queixas de tosse, falta de ar e cansaço, melhorar o estado nutricional, vai permitir tolerar melhor os tratamentos, e evitar o aparecimento de outras doenças como a bronquite, os enfartes e outros cancros
A contaminação ambiental, factores genéticos ou alterações moleculares também podem ser factores de risco para cancro de pulmão, embora numa percentagem muito pequena.
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O cancro do pulmão pode crescer durante muito tempo sem dar qualquer sintoma ou sinal, o que dificulta o seu diagnóstico nas fases iniciais.
Os sintomas de alerta para o cancro do pulmão são vários e muitos são comuns a doenças benignas o que dificulta o seu diagnóstico.
- Na pessoa com tosse do fumador a tosse torna-se irritativa e persistente.
- Hemorragia pela boca de sangue vivo ou escarro escuro.
- Dor torácica, no ombro e braço.
- Dificuldade respiratória
- Pieira ou chiadeira no peito
- Rouquidão e alteração da voz
- Dificuldade em engolir, edema da face e pescoço
- Fadiga, perda de apetite e emagrecimento.
- Dor óssea.
Uma pessoa com estes sintomas deve consultar rapidamente o médico.
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Para encontrar o tratamento mais adequado para cada caso é necessário conhecer o tipo de cancro do pulmão (diagnóstico histológico) e a sua extensão no corpo (estadiamento). Os exames escolhidos para efectuar o diagnóstico e o estadiamento variam de caso para caso.
Para fazer o estadiamento são feitos vários exames como radiografias, tomografias computadorizadas (TAC), ressonância magnéticas (RM) e tomografia de emissão de positrões (PET) para determinar quais as localizações no corpo atingidas pelo tumor. O estadiamento designa-se como TNM. O T caracteriza o tumor (tamanho, localização, invasão de estruturas vizinhas); o N caracteriza os gânglios linfáticos (são a primeira defesa, tentando conter as células tumorais e por isso aumentando de tamanho; o N varia de acordo com o número e localização dos gânglios afetados no tórax); o M indica se existem ou não metástases, o seu número e localização. De acordo com o T, o N e o M vamos obter um estadio da doença, que pode ser I, II, III ou IV.
Para fazer o diagnóstico histológico é necessário colher uma amostra de tecido com tumor para determinar as suas características. Podem ser usadas várias técnicas sendo as mais frequentes as que colhem material no pulmão, a saber, broncoscopias e biópsias transtorácicas. Pode também ser necessário colher material de outras lesões fora do pulmão.
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A escolha do tratamento depende do diagnóstico, do estadio da doença e das condições do doente. Uma equipa multidisciplinar composta por oncologistas, pneumologistas, cirurgiões, imagiologistas, patologistas e radioncologistas decide o protocolo mais adequado para cada caso.
Assim se vai decidir qual é o tratamento ou combinação de tratamentos mais adequado para cada doente.
Os tratamentos podem ser cirurgia, radioterapia, quimioterapia, tratamentos alvo e imunoterapia.
É fundamental sempre também o tratamento dos sintomas, para uma boa qualidade de vida.
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O cancro do pulmão é hereditário
FALSO: Algumas pessoas herdam mutações que podem aumentar o seu risco de vir a ter alguns cancros, mas no caso do cancro do pulmão não se identificaram mutações herdadas que possam sozinhas originar a doença.
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O cancro do pulmão é contagioso
FALSO: O cancro do pulmão não se transmite por qualquer tipo de contacto entre duas pessoas.
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O cancro do pulmão é uma doença dos homens
FALSO: O cancro do pulmão é neste momento o terceiro tumor mais frequente nas mulheres, a seguir ao cancro da mama e colo-rectal, e o segundo maior responsável pela mortalidade, logo a seguir ao cancro da mama
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O cancro do pulmão só aparece nos fumadores
FALSO: Embora cerca de 90% dos cancros do pulmão estejam relacionados com o tabagismo, pode haver outros factores de risco, nomeadamente contaminação ambiental, factores genéticos ou alterações moleculares.
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É impossível prevenir o aparecimento do cancro do pulmão
FALSO: Há vários agentes em estudo que poderão mais tarde vir a ser usados para prevenir o aparecimento do cancro em geral, mas actualmente não se conhece nenhuma substância capaz de evitar o aparecimento do cancro do pulmão.
Sabemos que o tabagismo é responsável por cerca de 90% dos casos de cancro do pulmão, e que a exposição ao fumo de outras pessoas em ambientes fechados também pode provocar cancro do pulmão.
Assim, o modo mais eficaz de prevenir o aparecimento de cancro do pulmão é terminar com o consumo do tabaco.
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Se fumar 3 ou 4 cigarros por dia não faz mal
FALSO: O consumo de tabaco está directamente relacionado com o aparecimento de cancro do pulmão, independentemente do número de cigarros consumidos.
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O tabagismo está-se a tornar um vício do passado
FALSO: Embora tenha havido uma diminuição do hábito nos adultos, tem vindo a aumentar nos jovens. O aparecimento de novas formas de consumo de nicotina (cigarros electrónicos, tabaco aquecido) tem tido grande aceitação por parte dos mais jovens.
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Consigo evitar a doença se fizer testes regulares
FALSO: Estudos recentes mostram que exames de rastreio em populações de risco podem detetar a doença mais cedo, mas não evitam o seu aparecimento. A única forma de o prevenir é não fumar.
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Se for ao estrangeiro tenho acesso a tratamentos mais inovadores
FALSO: Actualmente estão publicadas a nível europeu e mundial normas de orientação clínica oncológica, quer no diagnóstico quer na terapêutica, em permanente actualização.
A nível nacional existem vários centros de referência onde são seguidas estas normas.
Há em Portugal estudos e ensaios nacionais e internacionais.
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O diagnóstico de cancro é uma sentença de morte
FALSO: Os tumores diagnosticados em fases precoces são tratados com bons resultados. Os tumores diagnosticados em fases mais tardias têm actualmente terapêuticas mais eficazes que vieram melhorar de forma significativa as perspectivas destes doentes. Há em desenvolvimento grande número de tratamentos para todos os casos de cancro do pulmão que se apresentam muito promissores no tratamento desta doença.
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Reconhecer o estigma
O estigma vivenciado por doentes com cancro do pulmão é inegável, mas ele está de tal forma enraizado na história da doença, que pode nem ser reconhecido como tal pela maioria das pessoas. Na sua essência, um estigma nasce de uma perceção negativa associada a certo comportamento e, neste caso, ele existe devido ao forte vínculo da doença com o tabagismo.
O estigma no cancro do pulmão manifesta-se de duas formas: por um lado existe o estigma público e, por outro, o estigma infligido pelo próprio doente ou “auto-estigma”. O estigma público traduz-se na crença generalizada que os doentes com cancro do pulmão têm uma doença que provocaram a si próprios, por terem fumado. Ele pode ser demonstrado por qualquer pessoa, desde estranhos, amigos, familiares ou inclusivé profissionais de saúde, que nalgum momento podem pensar, dizer ou fazer coisas que julgam e culpabilizam o doente com cancro do pulmão, fazendo-o sentir que merece ter a doença. Já o auto-estigma resulta da interiorização pelo doente dos estereótipos negativos vigentes, o que se traduz em sentimentos de vergonha, culpa e auto recriminação. Para a maioria, essa culpa acrescenta uma grande carga emocional a uma situação já por si esmagadora.
Numa pesquisa realizada pela Global Lung Cancer Coalition que inquiriu mais de 16 mil pessoas em 16 países, os investigadores apuraram que até 29% das pessoas admitiram sentir menos simpatia em relação aos doentes de cancro do pulmão em comparação com os que sofrem de outros tipos de cancro, devido à sua associação com o tabaco. É esta faceta do estigma, a de desencorajar a compaixão, que constitui um dos aspectos mais relevantes desta problemática.
A origem do estigma
Embora a relação entre tabagismo e cancro do pulmão seja inquestionável, esta associação resultou numa visão unidimensional da doença na opinião pública. A grande maioria das campanhas anti-tabagismo generalizam a falsa crença de que fumar é a única causa de cancro de pulmão, e a noção equivocada de que os não fumadores estão livres de risco. Embora o objetivo dos media seja inibir as pessoas de fumar, uma consequência imprevista é a estigmatização deste grupo.
É necessário salientar que muitas pessoas que hoje vivem com cancro do pulmão são aquelas que começaram a fumar numa altura em que o tabaco não era apenas aceite, mas também considerado um factor de promoção social, e em que os efeitos nocivos a longo prazo deste hábito não eram conhecidos. Muitos deixaram de fumar entretanto, por vezes há várias décadas, mas apesar disso são alvo das mesmas mensagens de culpabilização, em vez de receberem o merecido elogio por terem superado o vício. O facto de os grandes fumadores muitas vezes apresentarem marcas físicas visíveis do seu hábito que são vistas como “repugnantes” pela maioria dos não fumadores (tais como dentes amarelos ou queimaduras nos dedos, pex) facilita ainda mais a materialização do estigma. Mas em última análise, o problema existe porque o público continua a ver o tabagismo como um mau hábito, e não como a dependência séria que é.
Na verdade, o estigma está de tal forma radicado, que mesmo os doentes que nunca fumaram tendem a ser responsabilizados. Quando partilham o seu diagnóstico, estes doentes ouvem vezes sem conta a questão “Mas fumavas?”, em vez das habituais mensagens de conforto que se dirigem a outro qualquer doente com cancro. Isso resulta num sentimento de mágoa, injustiça e revolta particularmente forte neste grupo.
As consequências
O estigma afecta adversamente não só o doente mas também os seus familiares e amigos, condicionando a forma como eles lidam com a doença e comunicam entre si e com a sociedade. Está bem documentado que o estigma está associado a resultados psicossociais e médicos negativos:
• Perda de autoconfiança, culpa e vergonha
• Medo de divulgar o diagnóstico
• Evicção de situações sociais e isolamento
• Maior stress, dificuldade em lidar com a doença, depressão
• Atraso na procura de cuidados de saúde
• Menor adesão ou recusa de tratamento e fontes potenciais de suporte
• Má qualidade de vida
• Sobrevida mais curta
• Ameaças a oportunidades econômicas e problemas financeiros
Embora o cancro de pulmão seja de longe o mais mortal, também é dos menos financiados.
Comparado a outros como o da mama e próstata, o cancro do pulmão tem recebido muito menor investimento, o que está indubitavelmente ligado ao forte estigma existente em torno da doença. Esta tendência começa a mostrar sinais de mudança, com o recente aparecimento de terapêuticas inovadores e rentáveis para a indústria. Mas para avançarmos de forma verdadeiramente positiva, é necessário acabar com o estigma que envolve o cancro do pulmão.
Estratégias anti-estigma
A educação é a chave para mudar a percepção do público e reduzir este estigma infundado. É necessário informar, fornecendo factos precisos:
• Fumar não é um mau hábito. De facto, fumar é um dos vícios mais difíceis de vencer.
• Factores genéticos podem predispor certos indivíduos ao cancro do pulmão, ou protegê-los.
• Outros fatores podem causar a doença, incluindo exposição ao radão, amianto, fumo passivo ou poluição ambiental.
• Até 20% dos doentes com cancro de pulmão nunca fumaram.
Através da comunicação, educação e campanhas estratégicas, a opinião pública pode ser moldada, sendo duas as mensagens chave que têm que ser passadas:
1. Qualquer pessoa pode ter cancro do pulmão. Para além do tabaco, existem muitos mecanismos para desenvolver a doença.
2. Ninguém merece ter cancro do pulmão. Nem mesmo os fumadores, que sofrem de uma dependência difícil de vencer. Em vez de culpar o fumador, a sociedade tem que se unir contra a indústria tabaqueira por vender um produto altamente viciante.
Sensibilizar o público para o sofrimento psicossocial que o estigma impõe aos doentes e seus cuidadores é também um passo importante para incentivar a mudança de mentalidades e fomentar a compaixão.
As comunidades científicas têm que trabalhar junto dos media no sentido de os conduzir a criar campanhas equilibradas, que eduquem sobre os riscos, mas que não fomentem o estigma.
Uma vez que nos últimos anos tem ocorrido um aumento de casos em não fumadores, é também necessário reorientar as mensagens na comunicação social para se alinharem com esta mudança demográfica. Focar as campanhas sobre cancro do pulmão nas histórias de sobreviventes é outra forma de mudar a carga negativa associada a este diagnóstico.
Por último, é necessário centrar esforços no apoio aos doentes. A educação é fundamental para acabar com o estigma autoinfligido. Devem ser encorajados a serem honestos sobre como o estigma os faz sentir, partilharem a sua experiência, e procurarem apoio noutros doentes, familiares, amigos e profissionais de saúde. Nunca é demais salientar também o papel da cessação tabágica, que entre outros benefícios, poderá contribuir para uma melhoria da auto-estima dos doentes que vivem com cancro do pulmão.
